Sete mulheres, sete visões e um samba só
Por Silvio Luz
O que corre à boca pequena (bem, nem tão pequena assim) é que o Samba de Rainha é impressionante de se ver ao vivo. A presença categórica e alegre de suas sete integrantes, entre percussionistas, instrumentistas e vocalista, colocam o samba no mais alto pedestal, valorizando o ritmo mais brasileiro com maestria.
As meninas começaram cantando em rodas de samba informais, mas logo viram que o buraco era mais embaixo (ou mais em cima). Com canções autorais e releituras de grandes compositores, como Ary Barroso e Benito Di Paula, o grupo já lançou dois discos, Isso é Samba de Rainha, de 2004, e Vivendo Samba, lançado no ano passado. Ano que projetou a música da banda para a Europa, na primeira turnê internacional.
O Samba de Rainha - composto por Núbia Maciel (vocal), Aidée Cristina (surdo), Erica Japa (rebolo), Gadi Pavezi (pandeiro), Naná Spogis (violão), Sandra Gamon (tamborim e repinique) e Thais Musachi (cavaco) - já abriu shows de Mart'nália, Leci Brandão e Marcelo D2 e é bem conhecido em bares de Sampa, como Traço de União, Bar Brahma e Vermont Itaim.
Na entrevista abaixo, Aidée Cristina, uma das principais compositoras do grupo, falou sobre o lugar da mulher no samba, shows internacionais, novo CD, entre outros temas. Confira o bate-papo na íntegra:
Depois de muito tempo relegado aos guetos, em décadas passadas, o samba já teve seus inúmeros ápices. E hoje? Qual o espaço reservado a este ritmo bem brasileiro?
Aidée Cristina - Graças a Deus o samba, há um bom tempo, é linguagem corrente de todo o brasileiro. O espaço é grande, diário e autêntico, pois no auge da maior alegria ou da maior tristeza, todo mundo tem sempre um samba bom para ilustrar o momento.
Ainda vivendo numa sociedade machista e patriarcal como a brasileira, acreditam que o Samba de Rainha está abrindo portas para que outras mulheres subam ao palco e sambem a própria liberdade?
Aidée Cristina - Deusas foram e são as verdadeiras rainhas como Dona Ivone Lara, Clara Nunes, Leci, Alcione, entre outras. Elas realmente abriram as portas e enfrentaram todas as barreiras para seguirem suas carreiras. Hoje, nós do Samba de Rainha só podemos subir num palco com naturalidade por causa delas. Se estivermos motivando outras garotas, maravilha! O importante é ter humildade, consciência e espalhar felicidade.
Fale um pouco sobre as apresentações fora do Brasil. O público de Portugal e Londres se aproximam, minimamente que seja, da nossa malemolência?
Aidée Cristina - Encontramos surpresas muito boas em Portugal. Nos apresentamos em palcos bem diferentes, desde galpões abertos para toda a população até o Teatro Circo de Braga, suntuoso, belo e extremamente histórico. Lá, os portugueses cultuam o bom samba e conhecem inúmeras canções do universo do samba brasileiro. Cantam e vibram à sua maneira, com todo o coração. Quando começamos a tocar e o povo levantou os braços junto, aí não teve mais como parar, foi magia pura. Em Londres fizemos um show com casa lotada, o que nos surpreendeu bastante. O público ficou agitado, dançou muito e até cantou conosco. E o ponto alto foi uma brincadeira que fazemos com a música Satisfaction, em ritmo de samba. Foi tudo! Quanto à malemolência, Brasil é Brasil!
Apesar de fazer samba, vocês mostram que quando se fala de música a produção que não inova e não mistura, também não se sustenta. Fale sobre essa abertura para outros ritmos, como é o caso da inserção de batidas eletrônicas na música Au Revoir Electro Dub Mix.
Aidée Cristina - Dentro da banda temos pessoas com gostos musicais e influências diferentes e é essa mistura que procuramos trazer para o nosso trabalho. É o tempero do nosso samba! No caso do remix de Au Revoir, foi a Sandra Gamon, que também é DJ, que fez junto com AS Spirit, especialmente para abrir o show do lançamento do CD Vivendo Samba. Como as pessoas adoraram, disponibilizamos para download no MySpace.
Tem algum lugar aqui em Sampa que vocês têm um carinho especial em tocar?
Aidée Cristina - Gostamos de tocar dentro da sua casa, no seu carro, no seu iPod, enfim... (risos). Não há uma preferência não, seja numa casa de show, num bar, numa roda, gostamos é de tocar!
Qual sambista vocês mais admiram e que mais influenciou toda a produção do Samba de Rainha?
Aidée Cristina - Unanimidade para todas nós é a Clara Nunes. Falando de sambistas, curtimos muito Arlindo Cruz, tem o Adilson Bispo que, juntamente com seus parceiros Lula Matos e Anderson Baiaco, fez pra gente o samba Chega de Fazer Pirraça, que gravamos no nosso mais recente disco. Mas a banda tem gostos ecléticos, então a admiraçãoo vai de Zeca Pagodinho a Marcelo D2, passando pela praia de Carlinhos Brown, Luiz Caldas, Noel Rosa, Dona Ivone e por aí vai.
Se não existisse samba, o mundo seria...
Aidée Cristina - Muito, mas muito triste e ruim da cabeça...
Hoje, mesmo com as maravilhas da internet, ainda é difícil ter um lugar ao sol?
Aidée Cristina - Claro que é trabalhoso! São mil artistas bons, muita música boa e disposição! Então, para seu trabalho aparecer é uma questao de fé, perseverança e uma aposta no escuro. Quem ganha com isso é o publico! Hoje, se uma música não aparece no circuito das rádios, ela pode encontrar uma legião de fãs na internet, que se comunicam, se encontram e prestigiam os shows. Trata-se de um veículo crucial para que se divulgue um trabalho. Não diria que é dificil ter um lugar ao sol, mas é trabalhoso. Mas sem paixão ninguém vai a lugar nenhum, não é?
Todas as sete integrantes conseguem viver só de música? Como foi o começo da carreira e o que tiveram de enfrentar?
Aidée Cristina - É aquela história da dedicação que eu comentei. No início, todas tinham suas profissões em outras áreas. No segundo ano de existência da banda, ou realmente nos empenhávamos em fazer desta banda uma coisa grande, ou sabíamos que teríamos dificuldades com o que criamos. Todas embarcaram de cabeça, deixamos os antigos empregos, passamos bocados bem apertados no final do mês e seguimos adiante. Valeu à pena, sem pensar um segundo! Ainda há muito caminho para percorrer, para se ter a estabilidade e o lugar ao sol que você citou. Mas todas nós estamos unidas e investindo em loucuras para melhorar e trazer um show, um CD cada vez mais bacana para todos que nos acompanham. Isso está no sangue, ninguém sossega!
Como está sendo a divulgação do mais recente disco de vocês, Vivendo Samba?
Aidée Cristina - O trabalho foi super bem aceito pelo público que já tinhamos e cativou outros, o que para nós é uma felicidade. O disco recebeu críticas positivas da imprensa, de sites e de blogs, e as vendas estão boas nas lojas do Brasil e do exterior. Nosso maior veículo de divulgação tem sido a internet, além dos shows, pois ali temos o contato próximo com as pessoas, que sambam conosco e retornam sempre. Isso é divulgação comprovada!
Quais os próximos shows da agenda da banda? Há a intenção de ir para o exterior neste ano também?
Aidée Cristina - Estamos todas as quartas no Brahminha (exceto dia 10 agora) e todos os domingos no Vermont Itaim (agenda completa). Estamos confirmando nossa estreia no Café Paon, em Moema. Em relação aos shows internacionais, graças a Deus, há sondagens, como os festivais de verão na Espanha. Mas vamos deixar acontecer!
No MySpace do Samba de Rainha há cinco músicas disponíveis para audição. No site oficial é possível conhecer um pouco mais sobre a história da banda, por meio de fotos e vídeos.
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Sensacional!
ResponderExcluirElas são demais.
Assisti a um único show delas (no Vermont), e definitivamente me encantei.
Contando as horas para ir no próximo.
Parabéns pelo blog e pelas entrevistas. =]]
beijão,
Carol Motta
O GRUPO "SAMBA DE RAINHA" FAZ UM TRABALHO INTERESSANTE, DEDICAM -SE DE CORPO E ALMA AO QUE SE PROPUSERAM...
ResponderExcluirPARABÉNS POR ESSA E POR TODAS AS OUTRAS ENTREVISTAS, BEM SELECIONADAS, ATENTAS AO MUNDO MUSICAL, NÃO ESPERAVA MENOS DE VOCÊ, É ISSO AÍ MULEKE!
OBS.: NESSA ENTREVISTA EM ESPECÍFICO, SE ME PERMITE, APENAS NÃO CONCORDO QUANDO VOCÊ AFIRMA QUE QUEM NÃO "MISTURA" ESTÁ FADADO AO MESMO E QUE TALVEZ NÃO SE FAÇA PERCEBER NESSA MULTIDÃO DE BONS TRABALHOS QUE EXISTEM POR AÍ AFORA...
PENSO QUE A "MISTURA" É UMA TENTATIVA DE "ATIRAR PARA TODOS OS LADOS", O QUE DER MAIS CERTO...
AS VERTENTES POPULARESCAS DOS RITMOS TRADICIONAIS QUE CADA VEZ MAIS PROLIFERAM NAS MÍDIAS (PAGODE, NEO ISSO, NEO AQUILO, NÃO SEI O QUÊ UNIVERSITÁRIO...O POP MEDIANO E MEDÍOCRE DE FORMA GERAL...) SE APOIAM EXATAMENTE NESSA PERIGOSA JUSTIFICATIVA DE INOVAR SEMPRE A QUALQUER CUSTO, MESMO QUE PARA ISSO PROSTITUAM, BANALIZEM, DESFOQUEM, ESPOLIEM AS MANIFESTAÇÕES POPULARES COMO NO CASO DO SAMBA, AUTÊNTICA CULTURA POPULAR BRASILEIRA QUE SE VÊ REFÉM DESSES GRUPINHOS MELOSOS EM SE TRATANDO DE ESPAÇO, QUE ALIÁS, ESPAÇO ESTE QUE DEVERIA SER PARA QUEM TEM CONTEÚDO E TALENTO DE VERDADE, NÃO PARA QUEM O COMPRA...
CLARO, NÃO É O CASO DO SAMBA DE RAINHA, MAS DA GRANDE MAIORIA QUE METE A MÃO NESSA CUMBUCA...IMPORTAM-SE APENAS EM LUCRAR...
GRANDE ABRAÇO, PARABÉNS MAIS UMA VEZ!
ROBERTO IVAN - SAMBISTA
Pô Ivan, brigadão pela presença aqui no blog. Concordo contigo quando fala que tem muita gente aí que só pensa em lucrar mesmo, que não se importa com a alegria da música, e do samba, em particular... Mas para esclarecer: a mistura que eu digo é a mistura que contribui para criar uma sonoridade ainda mais rica, por exemplo pegar o samba e incluir algumas batidas de baião (que tal? rs), não digo no sentido de buscar o novo a qualquer custo, porque o que vemos, como você disse, é muita gente tentando fazer coisas novas, apenas com um objetivo: encher o bolso e pouco se importando com a música em si.
ResponderExcluirÉ isso. Brigadão mais uma vez aí pela audiência! Abraço meu caro! (tô de olho nos teus e-mails do Pedra 90 hein...)